sábado, 13 de agosto de 2011

Não Importa


Era meia noite ainda, a noite gostosa, tudo bem, por incrível que pareça, calmo e tranquilo, no centrão. No centro você nunca está sozinho, quero dizer, fisicamente, há sempre os vizinhos do prédio da frente e o barulho dos carros nunca para. Mas, mesmo sendo ainda meia noite, eu me sentia completamente sozinha. Eu estava numa espécie de prisão mental, sem vontade de ler, ver um filme, sem vontade de dormir. Sentei em uma cadeira na sala, apoiei os cotovelos na mesma, segurei meu rosto, o cabelo caiu pra trás, fez-me sentir confortável, olho pra janela, o reflexo do vidro mostra meu rosto, meus ombros nus, e mesmo insatisfeita com todo o tédio de uma noite qualquer, eu me sinto bem, minha vaidade dorme tranquila, porém não sorrio, só me fito indiferente.  Mesmo sendo só meia noite, eu me sinto completamente sozinha. Ninguém mais dorme no primeiro quarto. Eu deveria estar dormindo no segundo, simplesmente não quero dormir, não quero.

Todos estão ausentes, nas janelas da frente, a costureira, o novo vizinho, a moça, os casais, bem, todas as luzes estão apagadas e mesmo os apartamentos que eu não posso enxergar, na parte de cima têm as cortinas fechadas e luzes fracas pairando no ambiente. “Será que é só meia noite?”. Levanto, fecho a janela, ando pelo corredor escuro e vazio. Não é um sentimento de solidão qualquer, mas abandono, me sinto abandonada, é isso. Pego o telefone. O telefone chama, nada de diferente. “Alô”, responde. “Oi, sou eu”. “Oi, querida, está tudo bem?”. Penso na pergunta, por que não estaria bem? Mas por incrível que tudo seja, eu não me sinto bem. Me sinto vazia. Nula. Oca. Não sou assim. “Não sei. Pode vir pra cá? Estou me sentindo sozinha.”. Ele responde que está vindo, diz qualquer coisa, respondo qualquer coisa. Desligo. Dois quarteirões.

Eu o amo profundamente, ele reclama de frieza, não sou fria, ele sabe disso, sei que ele sabe sim.
Escuto barulho do elevador. Ele abre a porta. A porta está sempre aberta, sempre.

“Oi.”, diz.
“Oi”, sorrio.

Encho as taças. Sentamos no sofá.. Nós somos muito amigos. Companheiros mesmo, há muito tempo. Ele me entende, eu penso que sim, mas a verdade é que ninguém entende ninguém nunca. Costumamos conversar muito, compartilhar experiências e pensamentos, pensar sobre a vida, escrever sobre ela, nem todo mundo está disposto a fazer isso. Mas isso não importa agora, me sinto muito sozinha. O silêncio agora condena a sala. Levanto, fecho a persiana. 

E depois do que penso ser uma eternidade, ele adormece, me abraçando, e eu me sinto protegida. Ainda sem vontade de dormir. Nenhuma. O tempo volta a passar devagar, os ponteiros do relógio passam a me beliscar a cada segundo, me incomodando, cutucando-me. Volto a me sentir sozinha,  abandonada. “Amor.”, chamei, o empurrei, acariciei seus ombros, chamei. Ele não vai acordar, tudo apagado, as janelas e os vizinhos dormindo, começo a dizer tudo o que passa pela minha cabeça, mesmo não havendo sentido algum, uma frase e outra, ele me entende, ele sempre me entende e isso basta. Enxugo as lágrimas do meu rosto, não há ninguém para ouvir. Nunca. Não faz sentido continuar, não importa. Já não é meia noite e nada nunca importa, nunca importou, pra ninguém.

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